Em Moda as carreiras não são feitas no micro-ondas

Quando me inscrevi para o dia aberto digital da CSM sobre o Mestrado em Comunicação de Moda, foi só por curiosidade. Talvez também fosse um misto de saudade da minha primeira escola de Moda. Se virem o meu calendário de conteúdos, não há nenhuma referência sobre o que estou agora a escrever.
Depois de uma hora a ver o incrível edifício da 1 Granary Square como pano de fundo de uma video - chamada, a mim todos esses backgrounds parecem-me esquisitos. Não sentia saudade apenas do primeiro curso de verão que fiz nesta escola, quando tinha 18 anos e de toda a experiência incrível… Do que eu realmente tinha saudades, era desta capacidade magnifica que existe na Central Saint Martins de fazerem um reality check ao mesmo tempo que nos enchem de esperança.
Não vou mentir, não gostei da forma como os cursos de curta duração foram um pouco desconsiderados na resposta a uma pergunta. Sim, todos podem fazer um curso de curta duração sem precisar passar por um processo de inscrição, mas tal facto não torna a experiência menos gratificante.
E, confesso, estava à espera de ver uma apresentação gira como era apanágio dos tutors de lá, mas uma conversa descontraída por chamada de Zoom relevou-se incrível.
Passemos agora ao reality check:
Não é sobre a escola
Não é sobre a escola, é sobre ti. Esta ideia veio do tutor que lidera a opção da Imagem de Moda do Mestrado. Não se tratando de uma citação, ao adicionarmos o sal e a pimenta ao nosso gosto, a questão é seguinte: Saint Martins não é mesmo um santo a sério. Portanto, não é pelo simples facto de estudares nesta famosa escola londrina que te irás converter no novo John Gallliano ou na nova Olya Kuryshcuck (se ainda não te apercebeste a 1 Granary — refiro-me desta vez à plataforma educativa, é uma enorme referência para mim).
Tens de trabalhar muito e esforçar-te ainda mais, isto é a Moda em menos de 10 palavras e, ainda assim continuamos a viver para ela, sem nada que possamos fazer para o evitar.
Tal como é verdade que a escola não é determinante, é verdade que é preponderante.
Quando ouvi um dos tutors dizer que a escola tem uma ambiente fantástico e todos se vão lembrar do teu nome, senti um misto de emoções.

Sei que é verdade, quando voltei um ano depois para o meu segundo short course, todos se lembram. Até num dia de chuvoso, um clássico do Verão londrino, à saída do metro foi uma excelente ocasião para reencontrar um dos meus adorados “tutores”.
A esta nostalgia doce junta-se um questionamento amargo. O que foi descrito também acontece na FAUL (a nossa querida escola de Moda Portuguesa), ainda que possa não ter o tal factor WOW da CSM. E é aí que entra o questionamento. Não poderia ser feito ainda melhor trabalho no nosso acolhedor polo de Moda, na Faculdade de Arquitectura numa das colinas de Lisboa, se os professores tivessem as mesmas condições, número de alunos e ferramentas e estruturas vagamente similares às existentes em prestigiadas escolas de terras de sua majestade?
Uma lasanha cheia de estilo
Ainda que, adore a CSM — para mim será sempre a “minha escola” da mesma forma que o é a Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa, onde fiz a Licenciatura e o Mestrado. Apesar de ter passado apenas 10 dias na primeira e cerca de 924 dias na segunda, fiz as contas descontando a quarenta pandémica — a minha anterior casa devia ser considerada uma “escola de Moda”, mas isso é matéria para um artigo futuro — tenho algumas queixas a fazer.
Da primeira vez que ali estive, provei a melhor lasanha de toda a minha vida — um prato fundo de lasanha com batatas fritas como acompanhamento e uma deliciosa fatia de pão de alho no topo — que magnífico almoço de cantina!

Em 2019, um ano depois, chega à hora de almoço e lá vou cheia de esperança para a cantina e a rezar para Segunda-feira fosse o dia da lasanha, a ementa mudara completamente e DEP, minha “lasanha fashion”.
As reclamações não terminam na lasanha, temos de falar dos hoodies e dos cadernos. Não é justo uma pessoa encontrar o hoodie mais confortável do mundo e quando volta para comprar outro está esgotada (não é consumismo porque o uso muito, OK?). Entrar uma loja que venda estacionário, material de costura, e material artístico é idílico, o que é brutalmente real é que não têm uma online store.
Diferenças entre Escritor de Moda e Jornalista de Moda + Tecnologia e IA
Há que voltar ao open day digital, o nosso ponto de partida. Uma questão que ecoava, pelo menos na minha perspectiva, durante a palestra era: como se diferencia um Escritor de Moda (Fashion Writer) de um Jornalista de Moda?
A Drª Elizabeth Kutesko, uma das tutors do Mestrado Comunicação: Histórias e Teorias, ajudou-me a chegar lá. Então aqui vamos nós, depois de eu ter adicionado açúcar e canela: a escrita de Moda pode adoptar múltiplas silhuetas e variadas tipologias — enquanto um jornalista deverá seguir a ética jornalística, ser preciso, basear-se em factos, comunicar a verdade, entre muitos outros aspectos.
Tal como nos diz Kutesko a escrita de Moda pode ter uma base mais teórica, ser académica — e associada à investigação e estudos de Moda possibilitarmos reescrever a História da própria Moda. Ou pode tomar a forma de crónicas de Moda, talvez algo assim como este texto.

Apesar de ser tutor na vertente de Jornalismo do Mestrado já tantas vezes mencionado mestrado, Danielle Radojcin explica como o currículo leccionado vai para lá do jornalismo em si, ao mesmo tempo que nos ajuda a completar o retrato da escrita de Moda que já havíamos começado.
Ao saber que plataformas como o Substack são tidas em consideração ao ajudarem os alunos a descobrir o seu próprio estilo de escrita, senti não só validação individual face ao projecto que estou a desenvolver como me permitiu reflectir sobre determinados aspectos da Moda actual.
Que aspectos? Que modelos de negócio para lá das marcas de designers independentes também são componentes do empreendedorismo de Moda. Que ser freelancer ou independente pode ser uma escolha com base na liberdade e não a última opção. E, que, na verdade, por mais cliché que soe, existem várias maneiras de estar na Moda.
Moda e dinheiro — uma carreira não é uma refeição de micro-ondas
Se estás à espera de glória instantânea, não é isso que se encontra numa escola de Moda de referência.
Se escolheste Moda só a pensar no dinheiro, talvez Moda não seja para ti.
Se não te dispões a abdicar do ego e a dedicar os próximos 10 a 15 anos a construir a tua carreira desde o 0, talvez devas repensar os teus planos.

Não te deixes iludir pela ideia daquilo que pensas ser o percurso de outros profissionais e colegas pelo que vês nas redes sociais, isso é só uma parte e nunca será o todo.
Estas foram as valiosas ideias deixadas por Adam Murray, responsável pelo MA Fashion Communication: Fashion Image.
Tenho trabalhos de casa, mas já os comecei…
Em jeito de conclusão, de algo que podia ser quase infindável, falo-vos dos meus trabalhos de casa — os que já comecei e de que ainda tenho para fazer.

Tenho de descobrir como tornar a escrita académica de Moda em algo que tenha em mente um público-alvo mais vasto, segundo Kutesko, a Vestoj é bom exemplo disto e será por aí que os meus próximos trabalhos de casa irão começar.
Mas sinto que como este artigo já dei inicio a um dos objectivos que tinha para este projecto chamado The Fashion Standup — estar onde e investigar aquilo que a agenda de estudantes, profissionais e entusiastas de Moda não lhes permite, e dar a minha perspectiva. Qual é o resulta? Uma newsletter que lês ao final da semana de trabalho ou ao Domingo ao fim do dia para te voltares a sintonizar e daqui extraíres food for thought. E food for thought é na realidade a base de tudo.