ModaLisboa Singular - Dia 3 e Dia 4

Olá___,
Eu não te disse que não demoraria a escrever-te a segunda carta? Pois aqui está! Adivinhas onde aconteceram os desfiles dos dia 3 e 4? Exacto, no Pátio da Galé! Lembraste de quando tinha 11 anos de te dizer que as portas no edifício eram muito altas? De facto, era só a percepção de uma criança, as portas não são assim tão grandes. Mas os acontecimentos são igualmente emocionantes e especiais.
De vestido escarlate rodado e decotado e, pulseira roxa onde se lia “ModaLisboa-Singular”, lá fui eu para um dia repleto de desfiles e de imensa criatividade.
Antes de te contar tudo ao detalhe vou delinear-te o meu dia, que não tem dia de semana ou mês, era o terceiro dia de ModaLisboa.
O meu dia começou pelo desfile conjunto das marcas de dois jovens designers da plataforma Workstation - Mestre Studio e Arndes. Depois seguiu-se a verdadeira maratona de desfiles, de hora a hora, com os desfiles de: Carlos Gil, Kolovrat e Buzina x Tous. Interrompi este alucinante e magnifico dia para recarregar com uma pizza Margherita no restaurante mesmo ao lado da entrada, claro que não me ia afastar muito. Não poderia perder o desfile de Ricardo Andrez, para pensar nas novas as adição ao meu armário. Finalizando o dia com a apresentação da colecção de Luís Carvalho.
Estás pronta para que te conte tudo? Segundo o meu ponto de vista, foi assim que aconteceu:
“Neste desfile, nota-se um claro amadurecimento da estética face às técnicas utilizados. Conquistando ainda mais a sua própria identidade estética.” Isto era o que eu tinha nas minhas notas… E eu iria continuar a escrever sobre tudo isto, até ler… até ler sobre como surgiu “antes que te esqueças de mim”. Não há como selecionar, o que cito para te escrever, pois sei que cada palavra te emocionará tanto quanto a mim, portanto colocas entre aspas e escrevo-as aqui para ti, a extensão daquilo que escrevo é irrelevante agora:
“Antes que te esqueças de mim” faz referência a uma fotografia de Adelaide Khaled, com o mesmo nome. Na fotografia estão presentes os avós do designer, num retrato que foi tirado com a intenção de captar uma última vez a essência de alguém, que devido à Alzheimer, se iria inevitavelmente esquecer dos seus.
O “antes que” e o “depois de”, quando, ao já não se ter algo, nos vemos obrigados a recorrer às memórias, por vezes no formato de roupa. Abrir o armário antigo e encontrar os cardigans de malha comidos das traças, sacudir-lhes o pó e sentir nas mãos os fios de lã desbotada, com cheiro a alfazema. A velha lata de bolachas cheia de botões, o dourado gasto da Singer junto à janela da marquise, as agulhas de tricô guardadas na gaveta dos naperons, tudo isso invoca memórias, invoca pessoas e a sua história. Esta coleção é uma ode aos que já não estão presentes, mas também aos que ainda nos rodeiam, como quem diz, “não me esqueço de ti.”

Arndes desde muito cedo encontrou o seu estilo e estabeleceu a sua linguagem visual. Tendo como ponto de partida conceitos de alfaiaria e uma modelagem aprimorada. Nesta colecção a tudo isto juntou ousadia, nas transparências e com piscar de olho ao surrealismo e ao ready-made neste seu “Colecionismo” Como? Com objectos como óculos de sol, fotografias, frascos de perfume e/ou verniz, notas manuscritos e até cartões identificativos
Carlos Gil apresentou uma coleção extensa que quase podia ser divida em núcleos ou mini coleções. E ainda que dê continuidade a questões que já tinha começado a explorar como os total looks de ganga, e não abandone as silhuetas que lhe são características, não deixa de inovar face a colecções anteriores.
E, nesta sua Fantasy junta os valores da sua região ao saber-fazer manual:
“Sediado no Fundão, uma região conhecida pelo seu espírito de entreajuda, acolhimento e solidariedade, Carlos Gil integrou na sua equipa especialistas, de origem indiana, em bordados com missangas, cuja mestria acrescenta um toque único às peças desta estação. ”
Lidja Kolovrat deu-nos a prova deu que a identidade portuguesa não é exclusivo de quem nascera em território luso. A designer nascida na Bósnia é portuguesa, sem sombra dúvida. A sua colecção que é, na verdade, um coração independente, responde taxativamente e, ainda que não de forma intencional, aos discursos da direita portuguesa que questionam a legitimidade da emigração portuguesa no país. Para além da música, a inspiração em Amália Rodrigues estende-se às propostas apresentadas ou talvez seja esta a percepção de uma amaliana. Mas onde estão tais referências? Nas estruturas leves das estruturas das saias volumosas e silhuetas.
Esta foi sem dúvida a uma interpretação emotiva do Portugal e da vivência lusa de Lidija Kolovrat. Não só para a própria, mas também para nós, que estávamos presentes. Ainda não consegui tirar da cabeça os colares com o magnífico pendente de um coração independente.
O “antes que” e o “depois de”, quando, ao já não se ter algo, nos vemos obrigados a recorrer às memórias, por vezes no formato de roupa. Abrir o armário antigo e encontrar os cardigans de malha comidos das traças, sacudir-lhes o pó e sentir nas mãos os fios de lã desbotada, com cheiro a alfazema. A velha lata de bolachas cheia de botões, o dourado gasto da Singer junto à janela da marquise, as agulhas de tricô guardadas na gaveta dos naperons, tudo isso invoca memórias, invoca pessoas e a sua história. Esta coleção é uma ode aos que já não estão presentes, mas também aos que ainda nos rodeiam, como quem diz, “não me esqueço de ti.”

Não foi só no desfile que a marca portuguesa Buzina colaborou com a dona do urso mais irónico do mundo - a espanhola Tous. Nesta coleção Vera Fernandes deu, não uma tela em branco, mas em tons de terracota para que este símbolo da democratização da joalharia e que constituiu um legado da mestria de gerações.
Buzina não se descaracteriza, em formas, volumes ou silhuetas. E Tous dá a conhecer ao mercado português, que está sempre de olhos postos na Semana de Moda de Lisboa, o seu lado mais Bold. Confirmando a versatilidade do seu conceito Hold, com argolas em diversos formatos apresentadas em tamanho XXL com o banho de ouro 18K com pendentes que juntam o ónix à equação.
A colecção de Ricardo Andrez é sempre constituída de peças que desejo vestir. E como se tal não fosse suficiente, o vermelho foi protagonista, cor a que não resisto. Andrez até me converte em fã de ganga.
E se as ilhoses já são um detalhe que caracteriza o designer, a experimentação não se encerra em nenhuma colecção, muito menos em “And suddenly, your scroll down is over”. Onde abordagem ao corpo feminino é descontraído e conceitos de feminilidade redefinidos sem receio.
Quem sempre defendeu que pensar em Moda é pensar o corpo, nesta colecção defende também que:
“Não somos uma marca. Não somos uma empresa. Somos seres humanos.
Claro que isto vai mudar a cada 30 segundos. Estamos apenas a seguir as nossas vidas.”

Luís Carvalho mais uma vez expande o nosso léxico cultural com a fotografia, nomeadamente, inspirando-se em Bastiaan Woudt. Aborda os contrastes cromáticos de uma forma que nos cativa e fascina, por entre o preto e o branco, o destaque do amarelo que nos agarra e envolve, e nos leva aos tons pastel de rosa e azul.
Nunca baixamos o olhar porque esta colecção “Round & Around” não nos solta - por quê?
Para mim é impossível resistir à sedução dos encaixes circulares, do padrão polka-dots e da celebração da “arte da dualidade no design”.
Ao deixar claro no comunicado de imprensa os seus agradecimentos prova que o ditado de “it takes a village” também se aplica à Moda.
Para mim, o último dia desta edição de Lisboa Fashion Week foi mais curto do que gostaria e do que é habitual. Mas sabes que, às vezes, a vida mete-se no caminho da Moda e tenta atrapalhar, então desenham-se soluções, nunca faltaria a um dia de ModaLisboa, não é?
Pronta? Prepara-te, vou-te transportar para a magia que vivi.
Quais os desfiles que assisti neste dia 4? Estive na segunda fila, com vista privilegiada para a entrada e saída das manequins na passarelle, dos desfiles de DuarteHajime, Luís Onofre, Hibu e Luís Buchinho.
Se achas que já te mapeei todos os pontos altos deste quarto acto, enganaste… Por quê? Porque para mim, começou no Locke de Santa Joana, na melhor pop-up store de Design Português, a que de forma singular, intregava esta ModaLisboa. O que trouxe comigo? Finalmente, o tão desejado casaco Ricardo Andrez. Um casaco lindo de ganga que pretendo estrear no meu aniversário.
De volta ao Terreiro do Paço e ao Pátio da Galé, pulseira ao alto, uma foto especial durante o dia e beijos sem batom. E agora, sim, vamos falar dos desfiles.
Quem pensa que o início do desfile da marca de Duarte foi mera performance engana-se, tratou-se de um repensar e questionar o próprio processo de confecção e modelagem. Por entre o seu streetwear mais sedimentado, mas jamais repetido; explorou:
“criaturas mitológicas, guardiões, estampados, Dragão Azul (Seiryu), Tigre Branco (Byakko), Tartaruga Negra (Genbu); Ave Vermelha do Sul (Suzaku).”

Eu sei que os clichés da sociedade ditam que todas as mulheres são apaixonadas por sapatos. Não que isto seja totalmente mentira, mas sinto que não tenho isenção nem conhecimento para falar de sapatos.
Falta de isenção, porque a minha relação com sapatos é muito marcada por factores práticos associados ao facto de ser portadora de uma deficiência. E não saber, nem conseguir usar sapatos de salto alto.
Conhecimento, não no sentido de ser utilizadora, obviamente, mas do de saber fazer. Não conheço o processo de fazer sapatos como experiência o processo de uma coleção de Moda sob o produto de roupa.
Portanto, para falar deste desfile e colecção inerente tenho de me socorrer daquelas que são as intenções do designer no envio da sua mensagem. Quando citado pela ModaLisboa sobre o que o inspira, o designer diz:
“Os modelos de Desire são sapatos sexys criados para alcançar uma expressão ainda maior quando calçados. São visualmente muito apelativos.”
Hibu trouxe-nos a performance como envolvente a básicos todos desejamos. Mesmo que não se tratem dos básicos no conceito consensual que associamos a peças básicas, mas porque vão tornar-se parte todos os outfits que usemos e são protagonistas potenciais em muitos guarda-roupas.
Queres provas de que era a ideia da designer? Pois aqui as tens:
“Mais uma vez, o HIBU Studio procura redefinir conceitos essenciais, criando uma coleção que eleva os básicos intemporais. Mistura silhuetas clássicas com detalhes distintivos e a estética dos anos 1990, criando peças que ressoam nostalgia e modernidade, mas também versatilidade e durabilidade.”

Queres provas de que era a ideia da designer? Pois aqui as tens:
“Mais uma vez, o HIBU Studio procura redefinir conceitos essenciais, criando uma coleção que eleva os básicos intemporais. Mistura silhuetas clássicas com detalhes distintivos e a estética dos anos 1990, criando peças que ressoam nostalgia e modernidade, mas também versatilidade e durabilidade.”

Luís Buchinho viajou no tempo para extrair inspiração do design gráfico dos anos 80, assim como nas tribos neorromânticas, bandas pop e as bandanas em voga na época.
No comportamento dos materiais e dos moldes as bandanas de base conceptual transparecem. No entanto, destacam os plissados que dão vida às peças, enaltecendo-as da cabeça aos pés.
E agora? Acho que já posso explorar mais Moda, porque já partilhei o que vi e vivi, porque Moda também é a emoção. E quando se trata de emoções tens de saboreá-las o mais possível, para que com estas encontres outras.
Concluídas que estão estas cartas, tens de esperar pelo que trarão as próximas edições de The Fashion Standup.
Entretanto, continua esta conversa no Instagran: @veralumendes & @thefashionstandup.